Ute Lemper: a guia turística de uma viagem pela Europa dos anos 40 e 50

Ute Lemper: a guia turística de uma viagem pela Europa dos anos 40 e 50

Passados quase dois anos desde os últimos concertos, Ute Lemper está de volta. Começou na Figueira da Foz; anteontem foi a vez do CCB a aplaudir de pé e ontem a Casa da Música foi a sortuda.

De cada vez que vamos ver um espetáculo de Ute Lemper já se sabe que vamos ter direito a um banho de cultura, sátira, sensualidade ao mais puro estilo femme fatale e muitas histórias. Nesta sexta-feira, 17 de março, não foi diferente e o Centro Cultural de Belém, em Lisboa, recebeu, novamente, a sua diva de braços abertos e sala praticamente cheia. Há muitos anos que é assim, como lembra a própria artista, nas recordações que guarda de Portugal desde que nos visitou pela primeira vez ainda nos anos 80. A mais recente visita foi em 2015, com “Last Tango In Berlin”.

Presença frequente entre nós, desta vez a enigmática cantora trouxe o espetáculo “Songs From The Heart” onde vai buscar canções que guarda consigo desde criança em recantos seus muito especiais e íntimos.

De palco sempre na penumbra, luzes amareladas e azuladas incidem sobre os três virtuosos músicos que a acompanham ao piano, no violoncelo e na concertina. Já a diva, surge com o seu habitual trajar de vestido comprido, preto, enorme racha lateral e um lenço vermelho escuro a adornar-lhe a cintura, com o seu quê de tango argentino que também lhe pontua a atuação de quase duas horas. ‘Purple Avenue’, de Tom Waits, é a primeira da noite que a cantora alemã descreve assim: «Vou levar-vos numa viagem que começa em Berlim, onde cresci. Os anjos contaram-me histórias que chegam da Argentina e de tantas outras culturas. São histórias de guerra, de sobrevivência, de esperança e de bares de whisky». Introdução perfeita para mais uma canção cheia de “fantasmas”; a de Nick Cave, ‘Little Water Song’.

Qualquer interpretação de Ute Lemper nos deixa boquiabertos pelo domínio e dicção perfeita com que fala qualquer idioma. Alemão, inglês ou francês parecem ser todas línguas maternas.

Léo Ferré e Charles Bukowski são outros dois poetas a que Ute presta homenagem sendo este segundo o responsável pelo primeiro grande momento em que a cantora deita cá para fora a raiva e fúria que «people are not good to each other» pede. Pelo meio, não faltou a alfinetada a Donald Trump. «Dizem que a última reencarnação de uma pessoa é a pior. É a fase em que ele está», brincou.

Jacques Brel também tem lugar neste concerto de canções especiais através do muito emocionante momento em que sussurra ‘Ne Me Quitte Pas’, talvez uma das canções mais tristes de todos os tempos. Pouco depois, recua-se até 1942, aos tempos da guerra e da importância de se cantar mensagens de esperança aos militares.

Com uma carreira longa e que inclui pepéis como atriz e bailarina, Ute Lemper é especialmente notável nas suas interpretações de canções de cabaret de Berlim, obras de Kurt Weill e Bertolt Brecht e na chanson française. Também o CCB assistiu a um medley delas onde não faltou ‘All That Jazz’ mas sabia bem ter saído também o saudoso ‘Mein Herr’ onde qualquer fã de Ute Lemper se apaixona por aquele ar de mulher que se prepara para vampirizar o homem que se atreva a roubar-lhe a felicidade em vão.

Como tudo o que é bom acaba depressa, também “Songs From The Heart” chega ao fim. «The tears always bring a new beginning», conforta-nos ela, antes de sair de palco com ‘Non Je Ne Regrette Rien’.

Daniela Azevedo  

Jornalista, curiosa sobre os media sociais, viciada em música, gosta da adrenalina do desporto motorizado. Amiga dos animais e apreciadora de dias de sol. Acha que a vida é melhor quando há discos de vinil e carros refrigerados a ar por perto.


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