Slash e a conspiração da cartola
A digressão que junta o mítico guitarrista dos Guns’n’Roses a Myles Kennedy (dos Alterbridge) terminou num Campo Pequeno esgotado. O outrora “bad boy” de Los Angeles é agora um homem diferente, mas o talento continua lá. Este é um relato de como Lisboa se transportou para os anos dourados do rock.
São 20 horas de uma noite primaveril em Lisboa e em redor da sala de touros do Campo Pequeno as filas, literalmente, dão a volta à arena e é enorme o dispositivo policial e de segurança que está montado. O caso não é para menos; Slash, julga-se, é ainda um “bad boy”, porém, a sua carreira, quer nos Guns’n’ Roses, quer nos Velvet Revolver, é também o reconhecimento da sua importância nestas coisas do rock. O mesmo sucede com Myles Kennedy nos “seus” Alterbridge. Por tudo isto já está justificada a plateia diversificada que vai entrando sem correrias (impedidas pela PSP) na sala lisboeta.
É já perto das 22 horas que o burburinho vai aumentando e uma enorme tela com os cabeças-de-cartaz se vai formando atrás da bateria e de uma enorme parede de amplificadores. Slash, Myles e os Conspiradores montam arraiais em cima do palco e todo o lado direito está guardado para o homem da cartola. Sem grandes floreados a banda arranca logo com uma The Call of the Wild do mais recente disco, arrancando logo de seguida para Halo e Standing In The Sun. Estranha-se a ausência de solos, mas Slash não é homem para se deixar levar a guitarra vai ganhando maior ênfase à medida que o concerto avança. Por esta altura já se percebeu que não haverá muitos temas dos G’N’R, o que não se estranha, dado o enorme reportório do guitarrista
Quanto a Myles Kennedy assume-se como uma voz de respeito numa banda que não é a sua e respeita o espaço do líder, recuando sempre que o “homem do leme” o exige, mas sem espalhafato, no entanto, o seu timbre ecoa e encaixa na perfeição em temas como Ghost e Back From Cali. Por aqui o rock é rei e Slash é o seu “deus”. Só assim se justifica que o músico deambule, em loucas corridas de uma ponta para outra em cima do palco (alguém se lembra de Axl Rose?). Como o concerto não se fixa, apenas, na presença do guitarrista e do vocalista, é altura de Todd Kernes, o baixista da banda, se chegar à frente nas malhas mais punk de Slash. Falamos, claro, de We´re All Gonna Die (cantada no original por Iggy Pop) e Doctor Alibi (originalmente cantada por Lemmy Kilmister).
De regresso ao palco Kennedy atira-se a uma The One You Loved is Gone e Slash faz-lhe frente com uma guitarra de dois braços. Este foi, talvez, o momento de viragem neste concerto. Por esta altura já se pensava onde andavam os temas de Guns’n’Roses, isso deu ainda mais tempo para pensar quando, num delírio orgásmico, Slash se atira a um solo de 15 minutos. Aborrecido para muitos, gáudio para outros tantos. O que é certo é que, sem que nada o fizesse prever a banda se atira a uma furiosa Nightrain (finalmente Guns). Pelo meio de um set com duas dezenas de canções, é injusto deixar algumas de parte, porém podemos dizer que por aqui passaram temas como You’re a Lie, Broken Sword ou Boulevard of Broken Hearts. Já em regime encore, e com alguns a abandonar o recinto, Slash, Kennedy e os Conspirators assumem o palco como sendo o seu estúdio e despedem-se com Slow Grind e Anastasia. Uma coisa é certa, Slash é um Senhor e reúne-se de senhores cujo talento lhe faz frente. Está feito um homem mas, não é por isso que deixamos de sentir Los Angeles nas décadas de 80 e 90. Quando dizem que o rock está morto, Slash mostra o oposto e, convenhamos, o homem até já se sabe rir. Sem ser um concerto brilhante, teve os seus momentos altos e viveu à custa de grandes momentos trazidos não por um homem, mas por uma banda. O rock está bem vivo.
Uma nota para os Bishop Gunn que, em apenas meia hora, aqueceram os motores de um Campo Pequeno que se ia enchendo. Com muita atitude e um rock que deve tanto ao blues como ao hard rock, a banda aproveitou a oportunidade e certamente que gerou curiosidade suficiente para se saber mais. Uma bela surpresa.