1º dia de NOS Alive – um misto de emoções contrastantes

1º  dia de NOS Alive – um misto de emoções contrastantes

No meio de uma situação política e económica incerta, os grandes festivais assumem um papel de escape e evasão, permitindo ao público geral mergulhar numa atmosfera de descontração e entretenimento. O NOS Alive, tem sido uma referência nesse sentido. Porém, os nomes que esgotaram o primeiro dia da 15ª edição, deixaram algo a desejar…

É certo afirmar, que este evento anual é um aglomerado de concertos e ativação de marcas que supera os desafios financeiros de Portugal. E como o faz? Com a velha equação matemática de: cartaz nacional e internacional diversificado + headliners de peso = money in the bank. Assim, consegue atrair diariamente uma ampla e variada audiência e obter um retorno bastante lucrativo.

No primeiro dia da edição anterior, intensificamos a importância de voltar a grandes festivais após 2 anos de pausa. O sentimento há um ano era outro (quiçá mais poético, aliviado e até grato). Em 2022, estávamos a recuperar do trauma pós-pandémico. A meio de 2023, entretanto, novos desafios económicos tecem uma teia que molda as expectativas e emoções inerentes a esta vivência.

Mas vocês querem é música…ou não?

A curadoria dos 7 palcos é tão heterógena que torna difícil captar a atenção de uma audiência inteira. Mesmo assim, temos de parabenizar artistas nacionais pela envolvência entre si e a plateia. No palco WTF Clubbing, a emergente Ana Lua Caiano e a sua one-woman band, os experienciados instrumentistas Club Makumba e os reis do kuduro electrónico Throes + The Shine, conseguiram cativar uma ‘casa’ que se revelou difícil em diversos momentos do dia.

 Live acts da América do Norte não aquecem os ânimos

No dia anterior na conferência pré-festival, o Diretor Álvaro Covões afirmava que o público português tem o hábito de chegar tarde a festivais. E os californianos The Driver Era inauguraram o Palco NOS com uma massa humana muito pouco composta.  Talvez fosse um indicativo da pertinência dos mesmos, ou esse mau hábito tipicamente tuga.

Já no Palco Heineken, foi impossível desfrutar dos canadenses, Men I Trust. Não é que a sua energia estivesse ao rubro, nem tal esperávamos do seu indie electro-pop arrastado. Mas diversos grupos de pessoas decidiram pôr a conversa em dia, como se estivessem no café. Antes da pandemia, este desrespeito total por concertos já existia. Ainda assim, parece estar pior que nunca, e já se alastrou em demasiados festivais. Não é só pela organização díspar de cartazes, é também falta de educação social e cultural.

Seguindo esta linha desconexa com o espírito festivaleiro, encontramos Puscifer no palco principal. Maynard James Keenan, conhecido pela sua ligação aos Tool, neste projeto apresenta um espetáculo distante do metal e com influências pós-punk pouco trabalhadas e quiçá, básicas.

Num momento de interação com o público, o vocalista brincou, dizendo: “Viemos em paz, somos uma banda rock e não uma agência governamental à caça de alienígenas”. No entanto, poucos reagiram a este wannabe agente Kay, revelando um ambiente talvez menos recetivo à estranheza do espetáculo. Todo o seu marketing e imagem tem sido gerado em torno deste conceito alienígena e dos Men In Black que era original há 20 anos… A aparência do vocalista, com batom vermelho borrado nos lábios, de fato e gravata, não conseguiram disfarçar totalmente a natureza peculiar da performance. Além dos visuais com predominância de LEDs sugerirem que talvez o grupo e os fãs se tivessem beneficiado de um ambiente mais fechado, e num horário diferente.

Outros americanos que nos encheram a alma pela metade foram os Black Keys. Ao longo dos anos a crítica tem afirmado que os encontra menos inspirados, e estamos em plena concordância. Sentimos uma vibe de dad rock que é não propriamente um elogio, ou tampouco uma crítica. O som de forma geral também esteve particularmente baixo, com a guitarra na sua maioria sobreposta à voz e até bateria. Dan Auerbach e Patrick Carney parecem literalmente cansados, e essa energia transpareceu para o público que continuou a pôr a conversa em dia sobre a filha da vizinha.

No entanto, o dia não era de nenhum dos artistas mencionados acima. Caso tivéssemos dúvidas, as centenas de t-shirts dos Red Hot Chili Peppers compradas nos tempos de adolescência millennial, revelavam bem quem eram os cabeças de cartaz do 1º dia. E apesar do feedback que sondamos dos fãs (até dos mais fervorosos) ser positivo, não foi bestial. É consenso geral que estas pimentas picantes, foram em certos momentos: um bocadinho insossas. E assim ficou, este arranque, marcado por encontros amenos com norte-americanos (mas no dia seguinte redimiram-se bem).

Diva do Coreto

Enquanto os mais saudosistas disfrutavam de Kiedis, Flea, Frusciante e Smith, fomos até ao Palco Coreto curado pela Arruada. Foi lá que encontramos Matilde Castro, proporcionando-nos uma das experiências mais ternurentas para guardar na memória deste festival.

Matilde é natural do Porto e há anos que se destaca como DJ e Produtora no coletivo PYRATZ com o seu famoso primo e digital influencer Peter Castro. As noites de Beyoncé Fest, H0LLABACK e BATIDÃO/Baile Funk (em conjunto com a promotora KEBRAKU) não são só um must-have do Norte, como até viajam com frequência até Lisboa.

Agora a solo, esta gaiense de gema continuou a destacar-se com seu amplo conhecimento de hip house, vogue beats, hip hop, amapiano, dancehall e até um pouco de funk. Porque foi especial? Porque foi um momento que só poderia ser compartilhado na memória das poucas dezenas de pessoas presentes. Ninguém, absolutamente ninguém, ficou indiferente às escolhas musicais desta diva do Coreto.

De repente, vimos os 5 técnicos de som com um sorriso estampado no rosto, incapazes de conter o balanço dos quadris ou dos pés. A pessoa responsável pela limpeza varria o chão em perfeita sincronia com a batida, como se estive a adorar a varridela. As senhoras das farturas mexiam o pescoço ao som das canções, e até mesmo o dono do camião cheio de peluches para o jogo de ‘tiro ao alvo’ não ficou indiferente! Naquele momento, nada mais importava. Os receios, as preocupações a os momentos duros que este mundo nos proporciona, ficaram fora das grades do recinto. Se não estivesse a passar uma mistura amapiano de Calabria 2007, diríamos que tínhamos acabado de entrar num universo paralelo da Disney.

Isto, foi um retorno completo à premissa inicial desta crítica: sobre a importância que os festivais assumem como uma forma de escape do quotidiano. Obrigado Matilde, Arruada e a todos que tornam isso possível!

No dia seguinte, sexta-feira 7 de julho, a América do Norte esteve novamente no habitual destaque, assim como os os britânicos Arctic Monkeys e a norueguesa girl in red não lhe ficaram atrás. Não te esqueças que podes ver a programação de eventos do género na nossa Agenda- CLICA AQUI –  relembramos que podes usar o teu telemóvel para marcar com uma ⭐️ os concertos que não queres perder!

Ana Duarte  

Consultora Musical na Fonograna e fundadora da webzine CONTRABANDA. Estudou Music Business na Arda Academy e Línguas, Literaturas e Culturas na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Tinha uns pais melómanos que a introduziram a concertos/festivais, ainda tinha ela dentes de leite. 3 décadas depois, aproveita para escrever umas coisas no ponto de vista de espetador melómano (quando a vida de consultora musical lhe permite).


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Mais sobre: Ana Lua Caiano, Black Keys, Club Makumba, Matilde Castro, Men I Trust, Puscifer, Red Hot Chili Peppers, The Driver Era, Throes + The Shine

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