O cometa Johnny Marr no Super Bock em Stock
O lendário guitarrista ex-Smiths pisou o palco do Coliseu dos Recreios no primeiro dia de Super Bock em Stock para apresentar Call The Comet, o último disco a solo, sem nunca esquecer os clássicos.
Não há como negar que quando se ouve o nome Johnny Marr a primeira coisa que nos vem à cabeça são os míticos Smiths. O próprio sabe que é esse o nome que paira nas cabeças de quem o vem ver e não tem receio de se atirar a alguns temas da banda de Manchester, mas será sempre injusto julgar a carreira de Marr sem ver para além da sua parceria com Morrissey.
Vejamos: depois dos Smiths, Johnny Marr tocou com nomes como Pretenders, Talking Heads, Kristy McColl, Beck, Pet Shop Boys, Oasis e mais recentemente Hans Zimmer, formou os Electronic com Bernard Sumner (ex-Joy Division e New Order), integrou os The The de Matt Johnson, os Modest Mouse de Isaac Brock e os Cribs dos irmãos Jarman. Em 2013, dedicou-se a uma carreira a solo cujo último de três trabalhos, Call The Comet, foi o pretexto para a vinda a esta edição do Super Bock em Stock. Diminui-lo, portanto, aos quatro discos de Smiths é, para além de injusto, um vulgar exercício de preguiça.
Perante um Coliseu a meio gás, Johnny Marr foi directo ao assunto com The Tracers, segunda canção de Call The Comet, a aquecer o caminho até ao primeiro salto ao passado. Bigmouth Strikes Again, o primeiro tema dos Smiths da noite, deu ânimo ao público mais faminto de nostalgia antes da energia da recente Day In Day Out ofuscar qualquer ideia de que seriam os velhos clássicos a tomar conta do concerto. Marr tem um disco para apresentar e fá-lo com o estilo de sempre, guitarra Fender Jaguar bem baixa e uma facilidade em debitar riffs e arpejos icónicos como se nada de mais se tratasse. É com esse cool de sempre que divaga em New Dominions e debita palavras de ordem na cativante Bug. Até que se ouve a hipnótica entrada de How Soon Is Now? e a plateia acorda para o ícone que tem à sua frente. Johnny Marr está em cima de uma coluna a brincar com a afinação da sua guitarra enquanto o público ainda está com dificuldade em digerir esta entrada a pés juntos. Um dos maiores hinos da carreira dos Smiths foi cantado a plenos pulmões, sem que se desse falta da voz de Morrissey.
E como a carreira do virtuoso guitarrista é feita de muitas colaborações, havia que celebrar também a parceria com Bernard Sumner na “disco de Manchester” dos Electronic, com Getting Away With It, um dos melhores momentos da noite. Na guitarra de Johnny Marr cabe tudo isto: a melodia “marca registada” dos Smiths, o rock moderno directo ao assunto, a disco ou a imersão mais experimental de temas novos como aquele que se seguiu: Walking Into The Sea. Antes da despedida houve tempo para o último single Spiral Cities, o regresso ao disco anterior com a animada Easy Money e o derradeiro adeus com aquela que deverá ser a maior canção dos Smiths. There Is A Light That Never Goes Out teve direito a coro ensurdecedor, claro. Para os certamente muitos que esperavam uma noite nostálgica, o concerto de Johnny Marr poderá ter sido decepcionante, mas quem se propôs a ouvir boas canções de um excelso guitarrista não poderá ter saído do Coliseu desiludido.