Entremuralhas 2016 – A reportagem
Em pleno Verão, e fortificado pelas muralhas do Castelo de Leiria, 2016 trouxe-nos a 7.ª edição do festival Entremuralhas. A cargo da organização FADE IN, uma entidade centrada nesta cidade, o Entremuralhas estabeleceu já uma tradição dentro das sonoridades alternativas mais negras.
A particularidade deste evento de três dias, poderia ser descrita com rótulos e simplificações, mas quem visita este festival, é convidado a expandir horizontes.
Foi isso que fizemos, entre quinta-feira, dia 25, e sábado, 27 de Agosto – andámos pelos meandros da acolhedora cidade de Leiria e uma possível viagem no tempo, pelas escadarias centenárias de um castelo que tem tanto de sinuosidade orgânica de fábula, como da tensão do fantasmagórico vitoriano.
Foram 15 os nomes que subiram a um dos três palcos do Entremuralhas. (Clicar nos links para ver as fotos)
25 de Agosto:
- SILENT RUNNERS no Palco Corpo
- KARIN PARK no Palco Corpo
- GRAUSAME TÖCHTER no Palco Corpo
26 de Agosto:
- ANGELIC FOE na Igreja da Pena
- DARK DOOR na Igreja da Pena
- KING DUDE no Palco Alma
- SEX GANG CHILDREN no Palco Alma
- FRUSTRATION no Palco Corpo
- DIE KRUPPS no Palco Corpo
27 de Agosto:
- HAR BELEX na Igreja da Pena
- GEOMETRIC VISION na Igreja da Pena
- IANVA no Palco Alma
- CORPO-MENTE no Palco Alma
- KITE no Palco Corpo
- VIVE LA FÊTE no Palco Corpo
Para além da música, o Entremuralhas é um evento firmadamente plural na sua multiexpressividade artística com performances e exposições enquadradas nas cores quentes que preenchem o castelo.
Na irregularidade do piso de pedra, ladeada pela vegetação que nos enquadra, andam várias centenas de pessoas de várias nacionalidades – todas num sentido só: apreciar um dos fins-de-semana mais reconfortantes da cultura em Portugal.
Silent Runners abriram os palcos com sons da Darkwave de Amesterdão, Holanda. A performance foi energética e convidativa, o que afastou imediatamente o quinteto holandês da imaturidade que preenche o início de muitos eventos.
O segundo nome desta edição do Entremuralhas foi Karin Park, que subiu ao Palco Corpo para apresentar o seu trabalho, num dos concertos mais apreciados do festival.
O primeiro dia teve ainda o som lascivo e a presença sensual velada pelo pulsar ousado de Aranea Peel, líder dominadora de Grausame Tochter. Temos forte crença que quem lá esteve guardará recordações curiosas, no mínimo.
Ao final das tardes de sexta e sábado, o festival contemplou-nos com concertos de Dark Door e também Har Belex e Geometric Vision, na Igreja da Pena. Ao mesmo tempo que se erguiam máquinas e telemóveis que registavam a beleza edificante deste espaço único, os ouvidos foram embalados pela sonoridade mais calma. Em alguns casos, estávamos perante autênticos recitais de instrumentalização neoclássica e lirismo vocal. Para além dos Dark Door, a Igreja da Pena recebeu também os Angelic Foe, na sexta-feira. Consideramos impossível alguém ficar indiferente à voz e presença de Annmarie Thim, que foi a diva de voz dos Arcana.
À conversa com os fãs mais expectantes, ficámos com a percepção de que muitas pessoas tinham especial interesse nas bandas que banharam o Palco Alma de sons mais intensos. Na sexta-feira, King Dude e Sex Gang Children mostraram o que a experiência permite aos artistas demonstrar em palco. Sábado, foi a vez de Ianva e Corpo-mente deixarem muitas bocas abertas com a intensidade dos temas tocados. Estas duas bandas permitem-se um quasi-experimentalismo progressivo que mescla estilos musicais sem por um segundo perder a sua coesão. Naturalmente, o agendamento destes dois nomes para o mesmo palco demonstrou ser uma escolha pragmática da parte da organização.
Se há forma de estabelecer o ecletismo, na música é de forma pragmática, através da apreciação da variedade de forma mais inclusiva.
Nisto, o Entremuralhas tornou-se referência, com presença de uma variedade de expressões na música, desde o post punk dos muito aguardados e apreciados Frustration, de França, ao som mais industrial dos alemães Die Krupps e até a um pop ousado dos Vive la Fête.
Após mais de três décadas de carreira, o público português teve a oportunidade de ver e dançar ao som do peso industrial dos Die Krupps, que nunca tinham pisado um palco em Portugal.
Somos forçados a deixar uma nota acerca do duo sueco Kite, oriundo da cidade de Malmö, que apresentou um avantgardismo electrónico de teclas e voz etérea. Witchcraft Synthpop é o termo que utilizam para categorizar o seu trabalho e, da nossa parte, podíamos perfeitamente afirmar que só pode ser bruxaria a forma como assoberbaram toda a gente. Sem negligenciarem a sua singularidade, os Kite conseguem evocar ao mesmo tempo a música de artistas como M83 ou mesmo Sigur Ros. Esta foi uma estreia absoluta em território nacional.
De novo, com estes nomes, a FADE IN aposta em artistas que substanciem um cartaz consolidado e sem o que vulgarmente se enquadra como “palha”.
Alguns visitantes que abordámos expressaram o desejo da continuidade do Entremuralhas. Curiosa é a nota de que imensos estiveram presentes em todas as edições do festival. O sentimento comum é de que passem doze meses rapidamente para a próxima edição, a oitava.
Não existe amadorismo no Entremuralhas. Isto é um culto. É um culto para conhecedores e é um culto para quem ousa abrir a mente ao incomum, ao ousado e ao solene.