E, ao terceiro dia, Conan Osiris conquistou a aldeia – Bons Sons 2018
Terceiro dia de festa na aldeia teve muito público e uma dose de belos concertos de Sean Riley & The Slowriders, PAUS ou Cais Sodré Funk Connection. Mas acabou por ser Conan Osiris a centrar todas as atenções e a afirmar-se como caso (muito) sério.
Foi o dia mais quente em Cem Soldos, onde ao início da tarde todos procuravam a sombra, o refresco de um borrifador (há voluntários a regar o público um pouco por todo o recinto) e muitas bebidas frescas. Ainda assim, as filas são pequenas e as esperas curtas. Este ano, para além do novo palco, há outra grande novidade no Bons Sons: os pagamentos passaram todos a ser feitos sem dinheiro. Isto é, cada membro do público tem um chip na pulseira que pode carregar com o montante que quiser e é daí que, a cada compra (seja nas bancas de comes e bebes, mercado de artesanato ou merchandising) é retirado o valor. O sistema está muito bem implementado, as filas reduziram e o dinheiro parece voar mais facilmente (a partir de certa altura já é difícil apercebermo-nos do valor que ainda temos disponível na pulseira). Mas tudo bem, aqui o lucro é para a aldeia e os seus habitantes, quem regressa vê o bem que o festival faz à aldeia e ninguém se importa de ajudar mais um bocadinho. No final, o saldo que restar pode ser levantado de volta mas não tem de o ser, como diz a organização, que sugere deixar um donativo a Cem Soldos dessa forma.
Musicalmente, o sábado de festival, que como manda a tradição pareceu ter sido o dia mais cheio, teve uma mão cheia de belos concertos. Mas ao final do dia, no dia seguinte e creio que para o resto do tempo todo, já só nos lembramos de um deles: Conan Osiris. O fenómeno da internet gerou muita expectativa mas ninguém esperava o que aconteceu. Uma enchente autêntica cercou o pequeno palco Aguardela, que às 2h15 recebeu o autor de Adoro Bolos. As músicas de Osiris não rodam em streaming e mal passam na rádio mas são cantadas, palavra a palavra, por uma mui vasta plateia em delírio. Celulitite, Titanique, Borrego ou 100 Paciência foram dos temas mais celebrados, por entre o pasmo pela sua postura, voz, apresentação e bailarino acompanhante. Quem pensou que Osiris fosse moda passageira ter-se-á enganado redondamente, pois o rapaz que no dia-a-dia responde por Tiago Miranda é um fenómeno que provou em Cem Soldos o quão maior ainda pode vir a ser. Adoro Bolos foi obviamente a canção mais festejada, um êxito da internet que depois de ter passado para a rádio e para a televisão chegou agora à aldeia. E se nesta aldeia gostam tanto dele, pouco faltará para o país inteiro se render.
Antes da madrugada que Conan Osiris dominou, a noite no Bons Sons foi rica em concertos felizes. Primeiro Sean Riley & The Slowriders debitaram o seu rock de influência americana no largo principal da aldeia. Num concerto contido mas eficaz, Afonso Rodrigues e a sua banda percorreram temas de riff forte, teclas incisivas e groove aliciante. As mais recentes Dili e Greetings terão sido mais reconhecidas num concerto em que a banda de Leiria pode não ter provocado grandes ondas de entusiasmo mas onde cumpriu tudo o que lhe era exigido. Até porque agitação era o que não ia faltar no resto da noite. Primeiro os PAUS, no palco Zeca Afonso, tiveram moche e crowdsurf e uma plateia repleta a recebê-los. De regresso à aldeia 6 anos depois da estreia, o grupo da bateria siamesa trouxe Madeira e não só ao Bons Sons. Quim Albergaria fez questão de dizer o quão feliz estava por ter tanta gente ali, Hélio Morais falou da importância deste festival, Makoto caminhou sobre o público para festejar o seu aniversário. No final mandaram toda a gente ir ver Cais Sodré Funk Connection, “o Silk vai dar um concertão!”. Dito e feito, que no palco Lopes Graça a madrugada entrou ao som do funk e soul do colectivo que conta com nomes como João Gomes, Francisco Rebelo ou David Pessoa e que tem nas vozes e performances de Tamin e Silk o seu maior trunfo. Canções como Like No Other, Summer Days Of Fun, Take It Like A Man ou Do The Math obrigaram a que o largo do Rossio se tornasse numa vasta pista de dança e até o mais céptico não resistiu a bater o pé.
A campaniça d’O Gajo, o sonho dos QuartoQuarto e a vénia a Zeca Medeiros
A tarde na aldeia pode ter sido obrigatoriamente melosa (estava mesmo muito calor, gente), mas houve várias tentativas bem sucedidas de fazer o público esquecer o sol tórrido. O primeiro a enfrentar a plateia a escaldar foi O Gajo e os seus temas instrumentais com viola campaniça. As viagens introspectivas combinaram bem com o ambiente e as visitas a repertório mais mexido não deixaram de provocar passos de dança. Ovação sonante e mais uma bela surpresa neste festival. No mesmo palco Giacometti, mais tarde, foi a vez de os QuartoQuarto se estrearem no Bons Sons. Uma estreia que foi especial não só por ter sido resultado da vitória no histórico concurso de bandas Termómetro mas também por membros da banda já terem sido público do festival. A música dos QuartoQuarto é intensa e imersiva, merecedora talvez de um outro horário, mas deixou boas ideias sobre o que um disco possa vir a ser. Estaremos atentos.
Já ao início da noite, no palco Zeca Afonso, Cem Soldos recebeu um histórico da cultura nacional que cantou, declamou e falou sempre naquele tom rouco que lhe conhecemos. Zeca Medeiros foi teatral como de habitual, cantou por Abril, chamou João Afonso (que havia tocado no festival no dia anterior) e foi recebido com muito carinho pelos presentes que ocuparam todo o espaço do novo palco com natural curiosidade. É bonito ver novos artistas a crescerem em Cem Soldos, mas mais bonito é ver nomes mais históricos a receberem uma merecida nova dose de atenção. No Bons Sons, felizmente, há espaço para todos.
O festival termina hoje com Lena D’Água e Primeira Dama, Dead Combo, Luís Severo e Linda Martini.
“terá-se” enganado <3
? Corrigido. Obrigado David.