Bill Callahan e Circuit des Yeux, o misticismo do indie e do folk

Bill Callahan é um nomes mais importantes da cena indie norte-americana e ontem à noite encheu a sala do Cinema São Jorge com a apresentação do seu mais recente álbum, Dream River.

A primeira parte do concerto foi entregue a Circuit des Yeux, liderado pela vocalista Haley Fohr. Com apenas 25 anos, Haley Fohr conta já com quatro álbuns editados e sabe como lamentar-se através das suas músicas tristes e sombrias. Normalmente existe uma certa escuridão na música que ela faz e que nos transporta para profundezas emocionais e, muitas vezes, intoxicantes. Dona de uma expressividade e dramatismo invulgares, basta conhecer toda a sua discografia e até mesmo as músicas mais optimistas para se perceber que são sérias e pesadas. Os seus discos, muitas vezes distanciados entre o tom sombrio e a distorção densa acrescentam mistério, impregnando a sua folk descaracterizada com vocalizações fantasmagóricas e oníricas. Mas com o tempo o seu trabalho tornou-se mais claro e o álbum Overdue é o registo mais directo e imediato que ela fez. E também o seu melhor. É sobretudo com este disco que a norte-americana preencherá a solo as aberturas de nove concertos de Bill Callahan na Europa.

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Se o mundo precisava de mais uma prova de que Bill Callahan tem um traço contraditório quase patológico, acabou por fazê-lo ontem à noite no Cinema São Jorge ao promover o seu mais recente álbum Dream River. Depois do seu lançamento em setembro do ano passado, Callahan recriou o disco, em modo dub, sob o título Have Fun with God. «Javelin Unlanding», além de ser o single, foi a primeira canção a ser lançada nesta versão, revelando o até então desconhecido amor do artista por música dub. Este estilo musical é muito abstracto, visceral, místico e espiritual. O finito e infinito profundamente enraizados na terra e no espaço, ainda assim, Callahan produziu versões dub para cada uma das outras sete canções, o que acabou por surpreender quem o ouve.

Enquanto Dream River permanece na maior parte sem interferir com o tema da mortalidade, a morte espreita como uma tendência em muitas canções, uma consequência necessária da fertilidade em «Spring», conjugada com o intervalo de «Ride My Arrow» e um perigo constante nos trajectos que compõem «Small Plane» e «Winter Road». O interesse de Bill C. em versões dub não é tanto rítmico ou formal como técnico e estrutural. As suas letras, normalmente a peça central do seu trabalho e pelo qual é muito elogiado, soltam-se de dentro para fora consoante o seu agrado, tal como acontece com a canção «The Sing», uma obra-prima carregada de eufemismo elegante que em versão dub torna-se um pouco soporífera. As músicas de Dream River são por si só evoluções dramáticas, particularmente em «Spring» e «Summer Painter», com as suas rajadas de guitarra e címbalos fazendo delas um verdadeiro furacão na narrativa. Já a canção «Seagull» ressoa um lado mais sonhador e lânguido.

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Bill Callahan, homem enigmático, sisudo e dono de um humor negro, só decidiu libertar-se do pseudónimo Smog depois do lançamento do álbum A River Ain´t Too Much To Love. Os discos mais recentes, Sometimes I Wish We Were An Eagle, Apocalypse e Dream River relevaram-se mais despojados e reduzidos ao essencial, enriquecidos com novos arranjos e instrumentos. Com a sala completamente lotada, e acompanhado por Matt Kinsey na guitarra, Jaime Zuverza no baixo e Adam Jones na bateria, Bill Callahan foi muito aplaudido e o público afervorou com músicas como «Too Many Birds» (2009), America (2011) e ainda a fantástica «Dress Sexy at My Funeral» (2000).

Fotos (disponibilizadas pela organização): Luís Martins

Mafalda Saraiva  

Eu sei lá resumir-me numa frase. Mas escrevo muitas no meu blog.


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