As canções falam por si – João Gil no Campo Pequeno

As canções falam por si - João Gil no Campo Pequeno

No dia do seu 62º aniversário, João Gil convidou novos e velhos amigos para celebrar no palco do Campo Pequeno. A noite chuvosa de quinta-feira passou pelo vasto reportório do músico perante uma sala bem composta – até o Presidente Marcelo e o Ministro Mário Centeno fizeram questão de estar presentes.

Foi Trovante, Rio Grande e Ala dos Namorados. Foi Moby Dick, Filarmónica Gil e Cabeças no Ar. A sua marca na música portuguesa é enorme e inegável, não só pelo impacto de cada grupo ou colaboração em que participou, mas também pela referência maior em que se tornou para as novas gerações de músicos nacionais. Miguel Araújo disse-o bem: olhando para a sua jovialidade e para o seu currículo, mais parece que João Gil celebra 62 anos de carreira e 40 de vida, e não o contrário.

Discos de duetos há muitos (e este ano Paulo de Carvalho também lançou um álbum no mesmo registo) mas “João Gil Por” foi para lá do cliché. Traz temas inéditos, sim, mas os de sempre são reinterpretados de forma exemplar, com novos arranjos e por vozes dos mais diversos cantos do panorama actual da música portuguesa. Em palco, manteve-se o registo do álbum, com a vasta carreira musical de João Gil a ser revisitada convidado atrás de convidado, nunca desprovendo o valor original de cada canção. Até que chegaram os camaradas do Rio Grande, e aí, meus senhores, não há que reinventar nada – mas já lá vamos.

A noite começou com os Shout! interpretando ‘Saudade’ a capella, logo depois acompanhados pelo aniversariante da noite e por Celina da Piedade para aquele arrepio na espinha que será sempre ‘Timor’. Assim que o público conseguiu, cantou-lhe os parabéns e deu-lhe uma merecida ovação de pé. Ao longo do espectáculo, João Gil afirmou não querer fazer grandes discursos e dedicar-se à música: “as canções falam por si”, disse. Houve (mais) temas do Trovante: ‘Esplanada’, por Tiago Bettencourt, ‘Xácara das Bruxas Dançando’, por uma incrível Ana Bacalhau, ‘Perdidamente’, com direito a ovação para Sara Tavares e, claro, ‘125 Azul’, versão quase spoken word de Carlão harmonizada por Sara Tavares; de Filarmónica Gil: ‘Deixa-te Ficar na Minha Casa’, por Filipe Pinto; e da Ala dos Namorados: ‘Loucos de Lisboa’ e ‘Solta-se o Beijo’, pelos próprios – incluindo um irrepreensível Nuno Guerreiro, e ‘Ao Fim do Mundo’, pelo vozeirão que é Tatanka. Houve também a voz suave de Márcia na bela ‘Memórias de Um Beijo’, a rouquidão de João Pedro Pais em ‘Providência Cautelar’ e uma belíssima ‘Dezembro’, com “a instituição” Jorge Palma.

Momentos altos foram vários: a paternal ‘Senta-te Aí’, por Miguel Araújo e ‘Nina’ (dedicada às mães), por Rui Veloso, são bons exemplos. A teatralidade de Rui Pregal da Cunha na divertida ‘O Preço do Amor’ ou a reunião com “dois grandes camaradas” – Luís Represas e Manuel Faria – para ‘Zorro’, também (só foi pena Represas a ter interrompido para falar de bola). Mas se João Gil evitou discursos sobre si, não poupou palavras para agradecer a quem desde sempre deu letras às suas canções. Antes de se juntar a António Zambujo para a bonita ‘Rosa Albardeira’, houve salva de palmas e homenagem sentida a um “velho amigo”, esse outro grande senhor da música portuguesa: João Monge.

Como sempre nestas coisas, o melhor fica para o fim. E o melhor foram três temas dos históricos Rio Grande. Todos eles ali: Jorge Palma ao piano, Tim no baixo – e de lenço ao pescoço (a salva de palmas interminável que se ouviu quando entrou em palco foi impressionante) -, João Gil e Rui Veloso na guitarra, e essa outra alta instituição que é Vitorino. Todos eles ali, juntos em palco, em 2017, a cantar as canções sempre. Se há momento que guardamos desta noite é este, o de uma sala cheia a cantar ‘Postal dos Correios’ (forte concorrente ao prémio de Canção Mais Portuguesa De Sempre) e as palavras de Gil que lhe seguiram: “Rio Grande vai voltar”.

Para o encore ficou reservada ‘Ao Sul’, tenra canção com João Gil na voz e o filho, Rafael Gil, à guitarra. ‘Saudade’ teve direito a bis e embalou o regresso ao palco de todos os convidados para um final em família. Noite bonita e celebração mais que justa para um dos maiores autores da música portuguesa contemporânea.

 

Edição: Daniela Azevedo

Teresa Colaço  

Tem pouco mais de metro e meio e especial queda para a nova música portuguesa. Não gostava de cogumelos mas agora até os tolera. Continua sem gostar de feijão verde.


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